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TECNOLOGIA NA INFÂNCIA E SEUS IMPACTOS NA DINÂMICA FAMILIAR

O acesso e a exposição de crianças e adolescentes às mídias digitais têm sido temas de crescente preocupação e análise, especialmente considerando as diretrizes emitidas por entidades respeitadas, como as orientações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Desde 2019, a SBP recomenda que crianças de até 2 anos não sejam expostas a dispositivos móveis e à internet, que de 2 a 5 anos tenham acesso limitado a no máximo 1 hora por dia, que crianças de 6 a 10 anos permaneçam entre 1 a 2 horas diárias e, finalmente, que adolescentes de 11 a 18 anos restrinjam o uso a, no máximo, 3 horas por dia. Estas orientações, ainda em vigor, refletem a preocupação com o equilíbrio saudável no uso de tecnologias e os potenciais riscos associados ao uso excessivo.

Recentemente, esse tema foi amplamente discutido em um simpósio focado no impacto da era digital na estrutura familiar. Diversos especialistas das áreas de psicologia, psiquiatria, serviço social e direito apresentaram evidências científicas sobre os possíveis danos do uso desmedido de mídias digitais. Estes estudos reforçam a ideia de que a exposição excessiva pode gerar consequências que vão desde prejuízos ao desenvolvimento cognitivo e emocional até a afetar as dinâmicas familiares.

Como médico psiquiatra, observo que a compreensão sobre o impacto do mundo digital nas famílias deve evoluir significativamente nos próximos anos. A revolução tecnológica trouxe mudanças sem precedentes, e pela primeira vez na história, vemos uma inversão interessante: filhos que detêm mais conhecimento sobre as tecnologias do que seus pais e, frequentemente, orientam os adultos sobre como navegar com segurança neste ambiente digital. Esta nova dinâmica de troca de conhecimentos entre gerações é inédita. As crianças de hoje têm acesso a um volume de informações e habilidades que não apenas as torna conscientes, mas as empodera de uma forma que não se via em tempos passados. Algumas delas, inclusive, conseguiram transformar esse conhecimento em ganhos financeiros, fato impensável há algumas décadas.

Comparando com grandes marcos da história, como a Revolução Industrial e a Revolução Científica, a Revolução Digital apresenta um impacto ainda mais abrupto. A industrialização e a ciência levaram séculos para se desenvolver, enquanto as transformações digitais ocorrem em uma velocidade exponencial, muitas vezes deixando famílias e comunidades sem tempo para se adaptarem. Mudanças nos hábitos, valores e costumes são percebidas rapidamente, e o choque inicial tende a ser maior do que a empolgação.

As consequências para famílias menos estruturadas e com menor acesso a informações são particularmente preocupantes. Esses grupos sociais são os mais suscetíveis a riscos, mas, ironicamente, nunca antes tiveram tanta visibilidade e acesso à inclusão digital. O fenômeno das redes sociais, por exemplo, permite que vozes que antes não teriam espaço agora sejam ouvidas e vistas, ampliando o alcance de experiências e narrativas antes restritas.

Para profissionais que atuam com famílias, é essencial compreender o potencial dual dessa realidade digital: um ambiente que, ao mesmo tempo em que oferece oportunidades inéditas, também apresenta desafios novos e complexos que exigem atenção, adaptação e estratégias informadas para lidar com os impactos dessa revolução.

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POR QUE IGNORAR PESSOAS PELO CELULAR PREJUDICA AS CONEXÕES HUMANAS?

Phubbing: O Impacto do Comportamento de Ignorar Outros Pelo Celular

O termo “phubbing” resulta da combinação de “phone” (telefone) e “snubbing” (esnobar), surgindo em 2012 em uma campanha australiana para conscientizar sobre o crescente hábito de ignorar a companhia em prol do celular. Embora os smartphones sejam ferramentas de conexão, ironicamente, essa prática vem se tornando uma barreira nas relações sociais. O phubbing revela uma nova faceta do vício em tecnologia, com efeitos psicológicos e sociais profundos.

Estudos mostram que o phubbing afeta não só a qualidade das interações, mas também a percepção de momentos simples, como uma refeição: 97% das pessoas dizem que a distração do celular reduz a apreciação da comida. Esse hábito também atinge em cheio os relacionamentos pessoais, resultando em um aumento da solidão e redução da satisfação nas amizades, o que impacta diretamente o bem-estar psicológico. Na esfera familiar e romântica, o phubbing se revela ainda mais prejudicial, levando a sentimentos de rejeição e exclusão, além de intensificar o isolamento emocional e a insatisfação.

A prática também está associada a uma maior probabilidade de envolvimento com redes sociais, como ocorre com quem tem alto nível de FoMO (medo de perder algo). Esse receio de “estar por fora” alimenta o phubbing, promovendo consequências psicológicas significativas, como redução da autoestima e do senso de pertencimento e aumento dos sintomas de depressão.

Consequentemente, o phubbing afeta não apenas a amizade, mas também a vida amorosa. Casais que enfrentam o phubbing relatam insatisfação, conflitos e sentimentos de alienação. Em um cenário onde o smartphone substitui a atenção, cresce o desgaste emocional e o distanciamento, evidenciando a importância de reavaliar o uso dos dispositivos.

Para evitar esse ciclo, é crucial conscientizar sobre o uso do celular e estabelecer limites. Psicólogos e terapeutas ocupacionais têm contribuído com práticas como “zonas livres de celular” e o desenvolvimento de habilidades sociais para ajudar a recuperar a conexão entre as pessoas. Intervenções terapêuticas, como a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), auxiliam na reeducação tecnológica, enquanto técnicas de mindfulness e regulação emocional orientam as pessoas a estarem mais presentes nas interações. Em contextos familiares, essas práticas podem fortalecer vínculos, reduzindo os impactos da distração digital e promovendo uma comunicação mais saudável.

O phubbing pode parecer um comportamento trivial, mas as pesquisas indicam que ele tem consequências reais para a saúde mental e para as relações interpessoais. Com a abordagem certa, é possível restaurar o equilíbrio e a presença nas interações, favorecendo o bem-estar e a qualidade das conexões humanas.

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A REVOLUÇÃO TECNOLÓGICA E AS PROFISSÕES QUE SOBREVIVEM À INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

A rápida evolução tecnológica tem gerado inquietação entre profissionais de diversas áreas, que temem perder seus empregos para a Inteligência Artificial (IA). Paradoxalmente, enquanto a tecnologia facilita muitas tarefas, ela também ameaça algumas profissões. No entanto, há áreas que permanecem resilientes diante dessa revolução, resguardadas por habilidades e competências humanas que ainda escapam à reprodução pelas máquinas, como a criatividade, a empatia e a capacidade de adaptação a contextos sociais complexos.

Um exemplo de profissão que se mantém robusta é a de locutor de mercado. Com anos de experiência, os locutores reconhecem que, apesar das inovações tecnológicas, o carisma e a interação com o público são insubstituíveis. A capacidade de atrair a curiosidade dos clientes, responder dúvidas e proporcionar uma experiência personalizada continua a ser uma competência humana essencial. A experiência e a observação do trabalho de outros profissionais também são aspectos que enriquecem a atuação desses locutores.

Na área culinária, a criatividade é fundamental. A tecnologia, longe de ser uma ameaça, tem se tornado uma aliada dos chefs e confeiteiros, simplificando tarefas sem substituir a essência do trabalho artesanal. Equipamentos avançados podem auxiliar em processos específicos, mas a humanização do atendimento e o carinho no preparo dos alimentos são características insubstituíveis pela IA. A inovação nas receitas e a personalização dos produtos para datas especiais reforçam a importância da criatividade e do toque humano na culinária.

A neuropsicologia, por sua vez, demonstra a importância da empatia e da compreensão das diferenças individuais. Mesmo com o avanço da IA, a capacidade de oferecer um olhar livre de julgamentos e um acolhimento genuíno é crucial para a saúde mental. A psicologia desempenha um papel vital em tempos de crise, promovendo conexões humanas profundas que as máquinas ainda não conseguem replicar.

A Inteligência Artificial, quando vista como uma ferramenta, complementa as atividades humanas. A automação já alterou significativamente tarefas cotidianas, como parte dos atendimentos e ligações telefônicas. No entanto, a resistência das pessoas em serem atendidas por máquinas em situações complexas ressalta a importância do contato humano. A IA pode otimizar processos, fornecer informações rápidas e precisas, e contribuir para a produtividade. No entanto, a revisão e a interpretação dessas informações exigem um olhar humano.

O desafio está em evitar a dependência excessiva da tecnologia e em garantir uma regulamentação que aborde questões como propriedade intelectual e combate às fake news. É essencial que os profissionais aprendam a utilizar a IA como uma ferramenta complementar, sem abrir mão de seu raciocínio crítico e capacidade analítica. A inteligência artificial deve ser vista como um complemento, não como um substituto para o conhecimento humano.

Enquanto a tecnologia avança e transforma o mercado de trabalho, algumas profissões se destacam por suas habilidades intrínsecas que ainda não podem ser replicadas por máquinas. A criatividade, a empatia e a adaptação continuam sendo competências humanas valiosas, garantindo a relevância e a resiliência dessas profissões na era digital.

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JUSTIÇA DETERMINA INDENIZAÇÃO POR CYBERBULLYING EM ESCOLA DE SANTA MARIA

Recentemente, um julgamento capturou a atenção do público e reforçou a importância da proteção digital de crianças e adolescentes, um tribunal no Brasil proferiu uma decisão emblemática sobre um caso de cyberbullying envolvendo estudantes de uma escola particular em Santa Maria. Uma mulher foi obrigada pela Justiça a compensar financeiramente tanto uma criança de 10 anos, vítima de ofensas online por parte de sua filha, quanto os pais da menor afetada.

Este caso se desenrolou quando a filha da ré utilizou um grupo de WhatsApp de sua turma do 5º ano para disseminar uma imagem da vítima, acompanhada de comentários pejorativos. Esse ato não apenas se tornou motivo de zombaria entre os colegas, mas também gerou uma onda de preocupação entre os pais que tomaram conhecimento do incidente. Os pais da criança prejudicada moveram uma ação de indenização, argumentando que o episódio levou ao isolamento social de sua filha, sua saída da escola e a necessidade de acompanhamento psicológico.

A sentença inicial da 2ª Vara Cível de Santa Maria foi posteriormente confirmada pela 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, que não só manteve a compensação aos pais, mas também estendeu a indenização por danos morais diretamente à criança afetada, destacando a gravidade do cyberbullying e a responsabilidade dos pais sobre as ações de seus filhos na internet.

A defesa argumentou que o ato perpetrado pela filha da acusada era uma brincadeira comum entre crianças, sem intenção de causar dano. Contudo, o argumento foi rejeitado pelo tribunal, que entendeu o ato como parte de um problema maior de bullying e cyberbullying entre os alunos, evidenciando a necessidade de intervenção.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) no Brasil estipula a responsabilidade coletiva de assegurar a dignidade das crianças e adolescentes, protegendo-os contra qualquer forma de abuso ou violência. Este caso ressalta a importância de tal estatuto, servindo como um lembrete para pais, educadores e instituições sobre a necessidade de promover um ambiente seguro e respeitoso tanto no espaço físico quanto no digital. A decisão também destaca que as escolas têm um papel fundamental na prevenção e no combate ao bullying, embora, neste caso específico, a instituição de ensino tenha sido considerada não negligente.

Esta ação judicial contra o cyberbullying, reforça a mensagem de que tais comportamentos têm consequências sérias e que a proteção das crianças e adolescentes no ambiente digital é uma responsabilidade compartilhada por todos.

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DEMÊNCIA DIGITAL: OS EFEITOS DO USO EXCESSIVO DE DISPOSITIVOS ELETRÔNICOS

A era digital trouxe consigo um aumento exponencial na conectividade, transformando a maneira como interagimos com o mundo ao nosso redor. O Brasil, em particular, se destaca nas estatísticas globais, com um aumento significativo na proporção de brasileiros conectados, atingindo 84,3% em 2023, de acordo com o relatório Digital 2023: Brazil, da We Are Social em parceria com a Meltwater. No entanto, esse aumento na conectividade não vem sem consequências, e um dos desafios é a chamada “Demência Digital”.

O que exatamente é a Demência Digital? O termo foi cunhado por especialistas coreanos que estudam o impacto do uso excessivo de dispositivos eletrônicos desde a década de 1990. Esse fenômeno descreve a deterioração progressiva das funções e habilidades cognitivas dos indivíduos devido a um desequilíbrio no desenvolvimento entre o hemisfério esquerdo e direito do cérebro. Pesquisas apontam que o cérebro de pessoas viciadas em smartphones e jogos online sofre um comprometimento significativo no lado direito, onde se concentram áreas relacionadas ao foco e memória, aumentando o risco de demência a longo prazo.

Esses prejuízos afetam pessoas de todas as idades, mas são particularmente críticos em crianças e jovens, uma vez que o cérebro humano só atinge sua maturidade funcional por volta dos 23 anos. A atrofia cerebral resultante pode ter sérias repercussões na capacidade de concentração e formação de memórias, que são fundamentais para o aprendizado. Além disso, o excesso de tempo de tela também afeta a socialização, pois o ser humano é inerentemente um ser social. Quando as pessoas se restringem ao mundo digital, podem perder a capacidade de empatia e de lidar com suas próprias emoções e as dos outros.

É importante destacar a necessidade de limitar o uso diário e diversificar os estímulos que promovem o desenvolvimento cerebral, especialmente em crianças. Seguindo as diretrizes da Sociedade Americana de Pediatria, crianças menores de 6 anos não devem usar telas, dada a elevada probabilidade de comprometimento cerebral.

No ambiente corporativo, a demência digital também se faz presente, afetando habilidades cognitivas essenciais para o desempenho profissional, como foco, concentração e aprendizado. Empresas são encorajadas a conscientizar seus colaboradores sobre os riscos para a saúde física e mental, bem como a criar espaços que promovam experiências sensoriais diversas e a interação social, para mitigar os danos causados pelo excesso de telas.

A Demência Digital é um desafio emergente que afeta indivíduos de todas as idades e, se não for abordada de forma adequada, pode ter consequências significativas na saúde mental e cognitiva. Portanto, a conscientização e a mudança de comportamento são essenciais para enfrentar esse problema crescente em nossa sociedade digital.